sexta-feira, 4 de maio de 2012

Isso que dá desmatar a floresta por Camila Bernardini





Algumas lágrimas escorriam pela face de Bukura. Seu ar tristonho chamou a atenção das outras que estavam ao redor. Todas em silêncio a observavam chorar. Uma imensa luz azul invadia o local. E a clareira que se fazia com a luz deixava bem claro o motivo pelo qual aquela pequena fada chorava. Muitas árvores cortadas. Ao lado dos troncos tombados ao chão, que logo virariam móveis ou qualquer outra coisa do capricho humano, alguns homens dormiam despreocupadamente. Homens esses que não sentiam a presença das fadas, que não pensavam, apenas agiam como máquinas destruindo cada vez mais o meio ambiente, com seus desmatamentos desenfreados. Sem sentimento de culpa, sem sentimento algum.
            Carlin e Tatin que já estavam tristes e aflitas de ver Bukura chorar voaram até a árvore onde a pequena amiga estava para tentar confortá-la. As duas a abraçaram, mas nada parecia adiantar. Os soluços e as lágrimas não cessavam.
            - Eu posso tocar a alma destes homens para que eles nunca mais façam isso.
            - Não adianta Tatin, esses homens não têm almas a serem tocadas.
            - Como não Bukura? – perguntou intrigada Carlin
            - Não vejo sentimentos neles, agem como máquinas.
            - Nos explique direito...
            - No decorrer de toda a história o homem sempre ganancioso, sempre destrói tudo ao seu redor em busca de poder, dinheiro. Sempre em busca de algo e nem nota que tudo os leva a destruição. Com isso se esquecem de sentir.
             Tatin ficou abismada, se aqueles homens não tinham alma humana e estavam destruindo seu lar e o de suas amigas. Assim como de muitos outros seres que viviam ali deveriam aprender uma lição. E foi então que uma idéia lhe ocorreu.
            - Vamos falar com Titânia, ela poderá nos ajudar.
            Bukura então sorriu aliviada. Sabia que dariam um jeito de espantar aqueles homens dali. Elas voaram então para o centro da floresta que ainda estava intocado. Muitas árvores, flores, passarinhos e outros animais. Todos seguros no seu lar que logo seria destruído se não dessem um jeito.
            No coração daquele reino verde havia a árvore mais esplêndida de todas. Tinha quase dez metros de alturas, com raízes grosas que se enrolavam muito rumo ao centro da terra. As árvores estavam com as folhas um pouco secas, apagadas devido a ser outono, mas mesmo assim carregava uma beleza admirável. Em cima dela viviam as pequenas fadas que protegiam aquele lugar.
            Pousada em um galho alto estava Titânia, suas luzes coloridas emanavam paz, segurança. Ela era a fada mais sábia, a mais procurada para dar conselhos e seu nome significava mãe terra. Quando as outras fadas se aproximaram sua voz serena disse:
            - Já sei para que vieram, e autorizo que façam. Mas tomem cuidado. Não quero nenhuma de vocês machucadas. Levem Holda com vocês!
            Holda, Carlin, Bukura e Tatin então voaram rumo à madeireira que ficava próxima a região e onde os troncos cortados das árvores iam parar. Em silêncio quando chegaram, aumentaram seus tamanhos para parecerem humanas. Percorreram o lugar que estava vazio, até que encontraram um enorme galpão onde entraram. Lá havia muita madeira, que outrora foram árvores lindas cortadas do lugar onde as fadas moravam.
            Ficaram quietas em silêncio esperando, até que ouviram o som de alguns carros chegando. Pelo cheiro já podiam sentir que era os mesmos homens que viram na floresta. Eles entraram no galpão rindo alto, conversando:
            - Logo vamos acabar com todas as árvores da região. O Reginaldo me ligou hoje e disse que as máquinas chegam depois de amanhã. Com elas nossas produções vão a todo vapor.
            - E vamos plantar sementes no lugar?
            - Ora como você é tolo Adriano. Claro que não!
            - Mas tudo vai ficar devastado e sem vida?
            Reginaldo lançou olhares para seus outros companheiros que riram muito. Ele cada vez se arrependia mais de ter contratado o menino para trabalhar. Mas devia favores aos pais dele, e prometeu arrumar um emprego para o filho. Mas estava cansado dos discursos ecológicos do garoto e de vê-lo chorar sempre que derrubavam uma árvore. Virou-lhe as costas sem responder. Caminhando entre as madeiras, notou que uma sombra corria mais ao fundo do galpão:
            - Quem esta ai?
            Não ouve nenhuma resposta apenas seus amigos que o olhavam intrigado perguntando o que tinha acontecido.
            - Notei uma sombra correndo logo ali. Deve ser algum curioso ou fiscal, vamos lá acabar com a raça de quem quer que seja.
            Com algumas facas na mão Reginaldo e seus homens começaram a vasculhar o galpão. Foi então que com um estrondo muitas madeiras caíram pelo chão. Reginaldo deu um pulo de susto e disse novamente:
            - Muito engraçadinho, melhor se mostrar logo.
            As fadas então saíram de seus esconderijos, e como estavam com seus corpos de humanas logo ouve uma série de assovios.
            - Ora, ora... O que fazem perdidas por aqui?
            Bukura que era ingênua e acreditava que uma boa conversa resolveria tudo disse:
            - Queremos que parem de destruir nossa floresta.
            - A floresta é de vocês? – perguntou Reginaldo
            - Vai ver elas são as guardiãs- disse Adriano
            - Você fantasia de mais moleque. Cala a boca! E o que vão nos dar em troca belezuras.
                        Tatin que ainda acreditava que podia usar seus poderes de sensibilidade para tocar a alma dos homens se aproximou deles. E ao tocar o rosto de Reginaldo, ele tentou beijá-la a força.
            - Me solta!
            - Que isso belezura, nem começamos a brincadeira.
            Holda que já estava inquieta e queria acabar logo com isso gritou
            - Solte-a!
            - Ou o que? – disse Carlos outro do bando.
            Holda fechou os olhos e tudo a sua volta foi se modificando. Uma intensa luz azul brilhava dela. Os homens assustados começaram a ficar inquietos com a ousadia de Reginaldo que ainda agarrava a Tatin pelo braço e não soltava mesmo vendo o que acontecia.
         A luz foi ficando cada vez mais forte e logo eles puderam sentir a intensa ventania ali dentro.  O que todos acharam estranho já que o local estava fechado. Adriano foi o único que sorriu e não sentiu medo. Ele soube naquela hora que essa era a fada Holda. A fada que rege os ventos e as tempestades de neve. Se insultada, ela fica brava com facilidade, é capaz de destruir todo um lugar com suas tempestades.
         O vento ia ficando mais e mais forte. Reginaldo soltou por fim a fada e pediu que parassem com aquilo. Para sua surpresa todas estavam de mãos dadas agora. E em um circulo a luz azul era ofuscante. Ele e seus homens tentavam proteger a visão pois a claridade era tanta que lhes incomodava. O único que não se sentia desconfortável era Adriano.
         As fadas então começaram a cantar uma música em uma língua estranha, nenhuma que fosse conhecida pelo homem. O vento já enfurecido para sair começou a derrubar as paredes do galpão e destruir tudo que tinha ali. A madeireira estava sendo posta para baixo. Reginaldo que tentava se segurar em um tronco cortado de uma árvore perdeu as forças e foi lançado para longe. Lançado para dentro do coração da floresta. Os outros homens ali tentavam se proteger como podiam. O frio então foi chegando e neve começou a cair. Eles viam tudo espantado, como podia cair neve no coração da Amazônia? Tudo foi ficando congelante, e aos poucos parou.
         Carlin então sorriu para Bukura e disse:
         - Agora sim podemos conversar com eles!
         Dirigiu-se aos homens assustados, cobertos de neve que tremiam e disse:
         - Sumam daqui!
         Todos correram assustados e nunca mais voltaram.
         Na cidade próxima aquele local no dia seguinte o casal lia o jornal em voz alta: “Cada vez mais nosso clima esta maluco, tendo tempestade de neve na região. Alguns homens feridos e um ainda esta desaparecido”
         Adriano que acabara de acordar e ouviu o que seus pais diziam riu e comentou:
         - Isso que dá desmatar a floresta!

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